quinta-feira, 15 de junho de 2017

O PREÇO PELA PRIMEIRA VEZ - CAPÍTULO II


SUGESTÃO: Antes leia o CAPÍTULO 01

Entre tantas fãs do jovem galã estava Meire, sua vizinha. Ela não estudava e nunca havia estado a sós com ele. Às vezes achava que só o admirava porque todas as garotas o admiravam. Todas as vezes que tinha que comprar alguma coisa no estabelecimento comercial ao lado, antes de por os pés na rua, já se imaginava diante dos olhos castanhos do balconista, que certamente estaria lá, entre o balcão e as prateleiras ao fundo, com suas empoeiradas garrafas de vinho tinto. Sabia que Afonsinho sempre notava o seu embaraço ao pedir a mercadoria e ela sempre trazia para casa, além do embrulho na mão, aquela lembrança na cabeça: o balconista singelamente trajado, com um jeito maroto de atender, de ir buscar a mercadoria em uma prateleira ou vitrine qualquer, de fazer o embrulho, de receber e conferir o dinheiro, devolver o troco ou anotar o que fica fiado, de agradecer a preferência e de sobra, cativar numa cantada com os olhos.
Meire ia ao estabelecimento menos que na verdade seria preciso, normalmente. Sua família era de baixa condição financeira. Órfã de pai desde aos seis anos de idade, morava numa pequena casa, que contrastava com a grande construção da loja comercial do pai de Afonsinho, com sua mãe e seu único irmão mais moço. Sempre estava lembrando de que era um ano mais velha que o príncipe encantado dos seus sonhos.

Já estudara.

Aos quatorze anos, estava cursando a sexta série no curso noturno. Estudava à noite ainda muito jovem, por que ao dia tinha que ficar em casa tomando conta dos afazeres domésticos em companhia do seu irmão de onze anos de idade. Sua mãe trabalhava de cozinheira com uma longa carga de trabalho em um restaurante.
Sua primeira amizade, no turno noturno, foi com Luzia, moça magra de ideias grossas, possuidora do terrível vício nicotínico.
Meire gostava de Luzia. Sentia-se bem em sua companhia. Até parecia que Luzia não era o que sempre falavam dela. Não, não acreditava. O povo tem a mania de inventar as coisas. Tudo bem que Luzia fumava muito. Fumava demais. Fumava no banheiro da escola. Tudo bem que suas roupas eram bastante decotadas, bastante curtas. Mas daí chamá-la de piranha não era justo. Por que não chamavam as filhas de papaizinho com esse nome? Todos sabem que quase todas as filhas de rico dessa cidade não têm lá muita moral. Mas tudo fica encoberto atrás do status dos pais. São quase todas, vacas de Basã. Só por que Luzia era pobre, chamam pelas costas com esse adjetivo desmoralizante.

A amizade das duas era perfeita. Eram carne e unha. Era sexta-feira, a turma não entrou para assistir aula. Ficaram empelotados no portão do colégio e pouco a pouco as turminhas foram se dispersando.

Luzia convidou Meire para irem a um bar, onde ela, Luzia, já haveria ido algumas vezes.

Meire, para não chegar cedo e ter que achar uma boa justificativa para a sua não entrada na escola, aceitou o convite da amiga.

O bar ficava num bairro de classe média da cidade. O local era lúgubre, as paredes salubres e as mesas desalinhadas. Ao lado de uma das portas de entrada, um cidadão anônimo tinha sido dominado pelo peso do álcool e caíra ali mesmo.

Luzia, puxando Meire pela mão, direcionou-se para uma mesa ocupada por três integrantes que já haviam esvaziado alguns copos enquanto conversavam alto e gracejavam à vontade. Meire foi apresentada pela amiga e calorosamente bem recebida pelo grupo enquanto Luzia providenciava assentos para as duas.

A conversa e os gracejos dos rapazes continuaram no mesmo ritmo e algumas vezes Luzia entrava no bate papo. Meire olhava de lado, olhava para fora, olhava para as outras pessoas e tentava ambientar-se. Era a primeira vez que estava num lugar assim. Desagradável? Não achava, apenas não estava habituada.

Depois de quarenta minutos já se ambientara. Passou a se interessar pelo assunto da patotinha e gracejava descontraidamente. Porém percebia o rumo bruto que aquela diversão ia tomando. Sentia medo. Talvez fosse melhor ter arriscado a chegar mais cedo em casa. Desculpa séria fácil achar uma. Enfim, resolveu deixar se levar para ver onde aquilo ia dar.

Luzia, que sentia bem a vontade desde que chegou, revezava a tragada com o gole. Meire a olhava e Luzia não percebia a reprovação da colega. Lembrou então do que falavam dela. Piranha. Será? Não. Reafirmou suas convicções. Daí a pouco viu que a mão de um dos rapazes roçava nas pernas de Luzia. Meire esperou uma reação de censura por parte da amiga. Decepcionou-se. Luzia retribuiu com um beijo permitindo que a mão do rapaz conquistasse mais terreno.

Ao lado de Meire estava outro rapaz, moreno, apresentava ter vinte e cinco anos de idade, fisionomia de mal nutrido e boêmio. Falava-lhe de filmes policiais: Quarenta e Oito Horas, Máquina Mortífera, Duro de Matar... Ela sorria e ouvia pouco interessada. Apenas ouvia e concordava. Torcia para que o conteúdo do rapaz fosse pouco nesse assunto. Era mais que ela esperava.


Já passava das dez da noite, Meire convidou Luzia para levá-la em casa. Esta recusou. O rapaz que estava ao seu lado ofereceu-se e Meire, sem nenhuma outra opção, não teve como recusar.

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